segunda-feira, 8 de dezembro de 2008

Insônia
















O que faz uma pessoa acordada até esta hora...o remédio não tá valendo nada kkkk, pesquisa na internet, em breve verão novos trabalhos, boa madrugada a todas.leio e do meu querido Fernnado Pessoa na voz de seu heterônimo.
Álvaro
de Campos
Insônia
Não durmo, nem espero dormir.
Nem na morte espero dormir.
Espera-me uma insônia da largura dos astros
E um bocejo inútil do comprimento do mundo.
Não durmo; não posso ler quando acordo de noite,
Não posso escrever quando acordo de noite,
Não posso pensar quando acordo de noite —
Meu Deus, nem posso sonhar quando acordo de noite!
Ah, o ópio de ser outra pessoa qualquer!
Não durmo, jazo, cadáver acordado, sentindo,
E o meu sentimento é um pensamento vazio
Passam por mim, transtornadas, coisas que me sucederam
— Todas aquelas de que me arrependo e me culpo
Passam por mim, transtornadas, coisas que me não sucederam — Todas aquelas de que me arrependo e me culpo;
Passam por mim, transtornadas, coisas que não são nada,
E até dessas me arrependo, me culpo, e não durmo.
Não tenho força para ter energia para acender um cigarro.

Fito a parede fronteira do quarto como se fosse o universo.
Lá fora há o silêncio dessa coisa toda.
Um grande silêncio apavorante noutra ocasião qualquer,
Noutra ocasião qualquer em que eu pudesse sentir.
Estou escrevendo versos realmente simpáticos —
Versos a dizer que não tenho nada que dizer,
Versos a teimar em dizer isso,

Versos, versos, versos, versos, versos

Tantos versos...
E a verdade toda, e a vida toda fora deles e de mim!
Tenho sono, não durmo, sinto e não sei em que sentir
Sou uma sensação sem pessoa correspondente,
Uma abstração de autoconsciência sem de quê,
Salvo o necessário para sentir consciência,
Salvo — sei lá salvo o quê...
Não durmo. Não durmo. Não durmo.

Que grande sono em toda a cabeça e em cima dos olhos e na alma! Que grande sono em tudo exceto no poder dormir!
Ó madrugada, tardas tanto... Vem...

Vem, inutilmente
Trazer-me outro dia igual a este, a ser seguido por outra noite igual a esta...
Vem trazer-me a alegria dessa esperança triste,
Porque sempre és alegre, e sempre trazes esperança,
Segundo a velha literatura das sensações.
Vem, traz a esperança, vem, traz a esperança.

O meu cansaço entra pelo colchão dentro. Doem-me as costas de não estar deitado de lado.
Se estivesse deitado de lado doíam-me as costas de estar deitado de lado.
Vem, madrugada, chega!
Que horas são? Não sei.
Não tenho energia para estender uma mão para o relógio,
Não tenho energia para nada, para mais nada...
Só para estes versos, escritos no dia seguinte
Sim, escritos no dia seguin
Todos os versos são sempre escritos no dia seguinte.
Noite absoluta, sossego absoluto, lá fora.

Paz em toda a Natureza
A Humanidade repousa e esquece as suas amargura
Exatamente
A Humanidade esquece as suas alegrias e amarguras.
Costuma dizer-se isto.
A Humanidade esquece, sim, a Humanidade esquece,
Mas mesmo acordada a Humanidade esqu
Exatamente. Mas não durmo.

Entre o sono e sonho,
Entre mim e o que em m
É o quem eu me suponho
Corre um rio sem fim.
Passou por outras margens,
Diversas mais além,
Naquelas várias viagens
Que todo o rio tem.
Chegou onde hoje habito
A casa que hoje sou.
Passa, se eu me medito
Se desperto, passou.
E quem me sinto e morre
No que me liga a mim
Dorme onde o rio corre -
Esse rio sem fim.
Fernando Pessoa, 11-9-1933

Um comentário:

Dani disse...

Minha querida, espero que vc tenha noites tranquilas daqui pra frente!
Foi uma pena não termos nos encontrado esse ano... Espero que em 2009 tenhamos oportunidades!! Um lindo Natal e festas de paz para vc e sua família...
Beijocas,
Danica